Dhuzati no Festival Visonário BoiKOT

7e5e20_bbd21b39e8804bb999318ade1f7e8be5mv2_d_3508_4961_s_4_2A resiliência e as conquistas da luta por uma vida não subordinada é o que nos move em torno das políticas que acreditamos como forma de vivência possível hoje. Para nós a precariedade é uma potência que respira autonomia e protagonismo político, convidando a criatividade, o apoio mútuo e o empoderamento para uma ciranda de experiências livres de especialistas, comprometidas a garantir com nossas próprias mãos e pelos nossos próprios meios as mais básicas de nossas necessidades.

É neste percurso dissidente, combativo e materialmente transitório que fomos convidadas a fazer parte do II Festival Visionário pelo Coletivo BoiKOT para compartilhar nossas práticas e conhecimentos a cerca de uma culinária de resistência, bem como preparar e oferecer comidas veganas objetivando a conexão sensorial e subjetiva das pessoas com meios livres, éticos e descolonais de alimentação. sam_2220Considerado possivelmente como o primeiro do gênero a oferecer uma alimentação vegetariana estrita no Brasil, o festival realizado na Fazenda Cajueiro na cidade de Altinho, agreste pernambucano, contou com a exuberante flora do semi-árido, ambiente noturno perfeito para observar os astros e uma grande variação de temperatura. O evento pretendeu ser um espaço onde a arte possui intenção de fomentar a transformação pessoal, se localizando como parte de uma onda de mudanças, cujas raízes remontam aos costumes ancestrais, mas com frutos revestidos de tecnologia e inovação. É a partir disso que nos aproximamos e depositamos energia nesta proposta, com uma equipe composta 100% por dissidentes sexuais e de gênero, autorganizadas e sem chefes com o desafio de levar uma proposta alimentar crítica, onde nossa autonomia e nossa insubordinação à autoridade machista e heterossexista servisse como tecnologia para destruir as hierarquias dentro da cozinha, a gourmetização (elitismo alimentar) e o higienismo.

Num ambiente voltado para a permacultura e bioconstrução, pudemos sentir que a autonomia jamais poderá ser elástica se as distintas forças que impulsionam o movimento não se entendam como uma rede e não se apoiem mutualmente. Através de nossa ação na cozinha tentamos mostrar que “faça você mesmo” está longe de ser faça de qualquer jeito. Uma vez que nossos fiscais e avaliadores não existem, nossa confiança é estabelecida pela eficácia e qualidade do que está sendo oferecido e das relações de cuidado, acolhimento, atenção e respeito que vamos construindo a partir disso. Para nós dissidentes, periféricas e antifascistas a frustração ou decepção na realização de experiências que coloquem em cheque as noções de civilidade, urbanismo e conforto consumista podem atuar fortificando a convencionalidade, reafirmando-a e descredibilizando nosso fazer dissidente. Entendemos autonomia muito mais que uma responsabilidade,  como uma tática de guerra.

O veganismo como tendência ética e em perspectiva interseccional, não se resume ao BoiKOT de produtos de origem animal, ele nos trás sobretudo, uma nova perspectiva de ocupar os territórios, questionando princípios escravistas, a colonização e as grandes monoculturas ameaçadoras de vidas selvagens humanas e não humanas. Na nossa vivência priorizamos a descolonização alimentar no resgate de ingredientes manipulados por nossas ancestralidades indígenas e negras, fazendo uso de PANCS e do próprio lixo que produzimos, pois a desconstrução e a emergência de novas vivências não se faz apenas com estéticas, mas sim com práticas cotidianas radicais e ameaçadoras das verdades científicas, capitalistas e civilizadas!

15133863_1137612422952917_1681694314_oSeguir, sempre errante, experimentando estas dinâmicas, nos trás alguns problemas, uma vez que somos monitoradas pelas tecnologias de vigilância capitalista. É certo que nosso envolvimento com ocupações, luta pela terra, trabalho ambulante, combate ao machismo, coleta e reciclagem de alimentos sempre nos tratá algum tipo de conflito com o Estado, instituições, mercado e com os fiéis colaboradores da modernidade ocidental, mas é exatamente na linha de fuga da normalidade que um outro fazer possível aflora, contrariando a reprodução sistemática incutida em nossa subjetividade, disseminando como vírus práticas categorizadas como nojentas, bizarras e ilegais e atuando como um câncer contra as políticas de controle dos corpos que sequestram a autonomia os seres em nome de uma saúde farmacológica, do Estado de Direito e da propriedade privada.

O Festival Visionário foi um desafio que possibilitou uma vivência incrível e um aprendizado coletivo e individual que se tornará referência ao longo de toda nossa trajetória! Só gratidão a quem nos prestigiou, apoiou e reconheceu nosso trabalho!

Axé Visionário
Nossas poções veganas e ebós anticivilizados estão se espalhando, sigamos!