Receita de massa de coxinha com recheio de maconha

maconhaplayBem, sabemos que os mais leigos e não tão sintonizados com nossa visão de mundo irão achar meio controverso esta abordagem, por acharem que esta coletiva está associada apenas com a alimentação. Mas antes que qualquer voz ingênua venha nos criticar, avançamos no discurso e dizemos: nosso interesse é pela autonomia e pela liberdade.

E é exatamente por isso que nos posicionamos. Motivades pelo excelente artigo do Recife Resiste sobre a oitava edição da Marcha da Maconha em Recife e pela recente informação que agrotóxicos e fertilizantes químicos estão sendo usados na produção da erva, achamos por bem fazer algumas considerações.

No Brasil a Marcha da Maconha começa a se movimentar em 2002, após um contexto de forte mobilização antiglobalização e a realização do primeiro Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Nesta conjunura debates sobre uma política horizontal, plural e descentralizada desencadearam a emergência de várias mobilizações políticas que clamavam por novas lógicas de organização, deslegitimação do apanágio legal elitista e contestação ao lucrativo esquema policial genocida. Apenas em 2006 que a Marcha começa a ser realizada sistematicamente por várias cidades do Brasil, entre elas Recife.

Incomodada com a crescente adesão popular, em 2008 várias cidades foram proibidas pela Justiça de realizarem a Marcha, acusadas de apologia ao uso de drogas e formação de quadrilha, sendo Recife, uma das poucas que conseguiu ir as ruas.

Depois de oito edições em Recife, o maior apelo da Marcha agora consiste em legitimar uma política coronelista e mendigar ao Estado a regulamentação do uso terapêutico, industrial, farmacêutico e recreativo da erva, adotando Jean Wyllys, autor do projeto que regulamenta a maconha, como celebridade da vez. Contudo, não esqueçamos que este é o mesmo Estado que anualmente mata milhares de pessoas negras nas periferias e que aplica milhares de reais na compra de armamento, acessórios e tecnologia para destruir plantações e criminalizar usuários. É decepcionante perceber que a inteligência política das pessoas que participam da Marcha não consegue captar que além de lucrativa a proibição investe nas instituições de controle social e repressão. Os terríveis resultados da guerra contra as drogas respingam apenas nas periferias e nos pequenos produtores rurais.

Porém não é nada surpreendente. Para a classe média a quantidade de mortos, a guerra civil instaurada pelo combate ao tráfico, o genocídio da juventude negra e as prisões nas operações militares no sertão não são mais importantes que a liberdade individual e liberal de fumar um baseado com tranquilidade, sem ser importunado pela polícia, seja na compra, seja no consumo. Para esta mesma classe média, que não entende nada sobre a política predatória da produção agroindustrial, mas argumenta as vias da legalização pelo viés da produção, o que importa é obter mais privilégios. Para isso, obedecer a polícia e fazer acordos com as instituições que mais lucram com o tráfico é o caminho básico para obtê-los.

Em Recife a Marcha teve apoio do Governo do Estado, do Ministério Público e do Tribunal de Justiça, órgãos públicos mandantes das diversas violências cometidas pela polícia. Na verdade, este apoio faz parte de uma estratégia de captura das pauta dos movimentos sociais que serve para iludir aqueles que acreditam em mudanças estruturais pela via legal. Eduardo Campos, pré-candidato a presidência da República e um dos maiores financiadores da indústria bélica e de sistema de informação da história de Pernambuco, diz enfaticamente que é contra a descriminalização e a favor de um combate mais efetivo conta as drogas. Segundo Campos, o caminho a ser seguido é por os traficantes na cadeia alimentando a população de meio milhões pessoas confinadas nos presídios brasileiros.

Além de possuir efeitos medicinais a Cannabis tem potencialidade alimentar. Na China antiga era comum usar suas folhas em infusão para incômodos relacionados a prisão de ventre e problemas de menstruação. Nós também acreditamos no efeitos terapêuticos da planta, bem como na riqueza de seu aroma para temperar saladas, molhos e incrementar sucos, mas não a qualquer preço.

A legalização da planta pode abrir precedentes para ampliar diversas tragédias e opressões que já ocorrem no Brasil. A exploração industrial da erva, pode fazê-la matéria-prima para óleos, rações animais, fibras para têxteis, medicamentos patenteados, cosméticos e produtos alimentares, tudo o que atualmente a soja é capaz de fazer. Ao defender a legalização e regulamentação é importante pensar nos territórios indígenas e quilombolas ainda não garantidos e considerar a exploração brutal de mão-de-obra no cultivo agrícola e no processamento industrial. Todas estas questões citadas estão longe de serem resolvidas e provavelmente são ignoradas pela classe média egoísta, que vê na Marcha a oportunidade de reivindicar a facilidade de conseguir um baseado para sua próxima festinha.

Pela luta de uma descriminalização interseccional
Por uma Marcha da Maconha libertária, antiracista, antifascista e anticapitalista