Há algum tempo atrás eu falei sobre um fato que levanta muita curiosidade: por que os índios têm cabelos limpos, sadios e brilhantes se não usam xampu?* E então fica a dúvida da necessidade real deste produto em nossas vidas ou se ele é apenas mais uma das grandes falácias da publicidade, que empurra inutilidades que acabam por se tornar verdadeiros essenciais.
Pois bem, o xampu apareceu pela primeira vez na Europa no final do século XVIII e não era de nenhuma maneira parecida com o produto que temos hoje. De fato, ele era apenas uma mistura de sabão (o mesmo do sabonete da época) diluído em água com ervas aromáticas. Mais tarde, somente em 1914, surgiu o xampu em barra, que seria largamente comercializado, e em 1927, o primeiro xampu líquido surgiu.
Durante todo este período, como as pessoas lavavam o cabelo? Bem, elas lavavam com água somente e quando o sabão começou a ser utilizado, o cabelo era lavado apenas algumas vezes por mês com a substância. Fato é que apenas na década de 60, começaram a surgir comerciais afirmando que não era saudável manter os cabelos sem lavagem por mais de um dia e então começou uma campanha de marketing fortíssima que convenceu a população de que o xampu era essencial em suas vidas e não só essencial como algo que deveria ser usado todos os dias.
Atualmente, a fórmula da maioria dos xampus comuns contém o famoso lauril sulfato, um componente suspeito de levar ao câncer e reações alérgicas, que enfraqueceriam o sistema imunológico. Ademais, saindo das suposições, vários dos componentes encontrados nos xampus comuns poluem as águas, causando danos aos recursos hídricos em larga escala de tempo (veja final do post).
É assim que, depois de tanto poluirmos e depois de tanto sermos enganados, o movimento do “no-poo” surgiu como forma de rechaçar a necessidade imposta do xampu e mostrar que nem ele e nem o condicionador são de fato necessários para nossa existência (inclusive social).
Eu resolvi testar a ideia duas vezes e na primeira fiquei dois meses lavando meu cabelo apenas com água. Infelizmente, não funcionou como as propagandas do movimento “no poo” tanto clamavam. Enquanto eu via fotos de cabelos maravilhosos e milagres sobre o efeito, na realidade, meu cabelo ficou extremamente oleoso.
Apesar disso, algo aconteceu: a minha necessidade de condicionador desapareceu. Nisso, eu resolvi dar mais crédito ao movimento e testar mais uma vez alguns meses mais tarde.
Por dois meses novamente eu resolvi eliminar o xampu da minha vida e, desta vez, resolvi me informar mais sobre o assunto para ver se tinha esquecido algum detalhe na primeira vez. De fato, existe todo um processo de transição que detalharei em passos abaixo:
1) Para quem quer começar o “no-poo” e se livrar desta substância, a primeira dica é começar a diminuir a quantidade de xampu que se leva à cabeça. Assim, tente medir o quanto você usa por banho e diminua pela metade. Uma dica é espalhar a substância nas mãos primeiramente e depois levar ao cabelo, pois isso ajudará a espalhar melhor. Fique uma semana fazendo isso e note se o cabelo tende a ficar mais oleoso. Se sim, continue tentando por mais uma semana ou mais, até que ele se acostume.
2) Quando tiver passado por este passo, diminua a quantidade de lavagens. Neste caso, se você lava todo dia, tente lavar um dia sim e um dia não e vá fazendo isso e aumentando o intervalo para dois dias a três dias sem lavagem e fique fazendo isso até que seu cabelo se acostume e não fique tão oleoso. Nesta fase, se você quiser lavar o cabelo e não for o dia do xampu, use somente água morna.
Estas duas fases demoram um pouco e vou ser sincera de que até aí tudo funcionou muito bem para mim. É importante lembrar que cada pessoa tem um tipo de cabelo e cabelos lisos e escorridos, como o meu, tendem a ser mais oleosos e demorar mais para se adaptar, enquanto que cabelos cacheados, crespos e afros tendem a se adaptar melhor. Outro fato importante de saber é que a oleosidade do cabelo é natural e importante para a saúde dos fios e o excesso de óleo é causado pelo uso do xampu e não por falta de lavagens. Apesar disso parecer estranho, o fato de usarmos muito xampu tira a oleosidade natural do cabelo, o que faz com que as glândulas sebáceas produzam ainda mais óleo. Assim, quando se começa a diminuir o uso do produto, notar-se-á que o cabelo ficará bem oleoso e deve-se esperar para que ele entre em uma fase de adaptação, para que as glândulas parem de produzir o excesso de óleo.
3) Se você teve paciência para as duas primeiras fases, está na hora de trocar o xampu pelo bicarbonato e pelo vinagre. Neste caso, o bicarbonato substituirá a ação detergente do xampu e o vinagre agirá como condicionador regulando o PH. Uma quantidade razoável de bicarbonato é uma colher de chá para um frasco de 250 ml de água. E o mesmo se faz para o vinagre, que deve ser de maçã (menos ácido). Apesar de não deixar cheiro, é possível usar também o suco de uma colher de limão diluído m 250 ml de água, lembrando que estas substâncias não devem ser usadas sob o Sol.
Outra informação importante é que a quantidade de bicarbonato e vinagre varia de pessoa para pessoa, então é importante fazer o teste. Comece usando esta quantidade que lhes falei e se o cabelo ficar muito seco diminua e se ficar oleoso aumente. Em alguns casos, o cabelo é tão oleoso que o vinagre não é necessário. No meu caso, eu não usei. Por fim, quando se for usar o vinagre, ele só deve ser espalhado nas pontas e enxaguado em seguida. Não o deixe no cabelo por muito tempo, pois isso poderia deixar o cabelo ácido ao invés de regular o PH.
4) Durante a fase 3 haverá um tempo de adaptação que poderá levar de duas a quatro semanas (ou mais se ele for muito oleoso). O ideal é lavar o cabelo como se lavava na fase 2, mas usando o bicarbonato, ao invés do xampu. Para a fase 4, o ideal é passar a usar somente água, depois que o tempo de adaptação com o bicarbonato passou. Lave somente com água por duas semanas e depois volte com o bicarbonato apenas no final da semana. Este tempo é útil para ajudar as glândulas a se adaptarem ao novo ambiente.
O “no-poo” constitui-se de todas estas quatro fases, porém ele não funciona para todo mundo. No meu caso, eu fiz todas as fases e, infelizmente, na última fase, meu cabelo estava tão oleoso que parecia estar molhado. Eu voltei para a fase 2 e agora estou tentando voltar para a três. De fato, como eu disse, pessoas com cabelo oleoso não se adaptam fácil com o “no-poo” e é preciso meses de adaptação. Além disso, em alguns casos, é preciso sim que um agente saponificante seja usado. Se você testar e der certo, fico grata de ter contribuído para que mais uma pessoa se torne auto-suficiente de mais um produto que é prejudicial ao meio-ambiente e à saúde, porém, se você não conseguiu, existem alternativas saudáveis de xampu e que não possuem parabenos e nem lauril sulfato em seus componentes.
Xampus orgânicos e veganos
Uma informação importante sobre xampus orgânicos e veganos é que nem sempre eles são tão naturais como parecem. Na maioria dos casos, eles possuem o lauril e somente os parabenos estão de fora. Assim, procure ler a lista dos ingredientes e não compre se eles possuírem os segui ntes componentes:
– formaldeídos como DMDM, hidantoína e bronopol: são potencialmente cancerígenos e alérgenos. São usados como preservativos.
– parabenos: são disruptores endócrinos, pois imitam a ação dos estrógenos Podem causar desregulamento do ciclo hormonal de mulheres e quando vão para a água, podem ameaçar a fauna, principalmente de peixes e anfíbios. Por fim, têm sido associados ao câncer de mama.
– fitalatos: associados à diminuição da produção de espermatozóides em humanos e animais. Usados para suavizar materiais, tornando-os mais maleáveis. – BPA: disruptor endócrino similar ao parabeno.
– Triclosan: mais encontrado em sabonetes, pode levar à seleção de bactérias resistentes e são disruptores endócrinos.
– Sódio lauril sulfato ou outros tipos de sais de lauril sulfato: usados para dar espuma, este componente é irritante da pele, mucosas e olhos e é tóxico para animais aquáticos, acumulando-se em seus tecidos. Além disso, ele é um pesticida natural, usado, inclusive, como agrotóxico e por fim, se misturado a trietanolamina, pode produzir nitrosames, substâncias comprovadamente cancerígenas.
Não é sem motivo que eu resolvi aderir à técnica do “no-poo”. Além de me tornar mais auto-suficiente, eu venho notando uma melhora na minha saúde capilar e sei que boicotando estes produtos, poluo menos o meio-ambiente e minha saúde. Por fim, para quem não der certo, xampus orgânicos são uma boa solução, desde que comprados com cautela.
Fonte: Pensando ao Contrário
Por Camila Gomes Victorino